29 de jun. de 2009

O doutor que desqualificou os jornalistas por Gerson Moreira Lima

Fonte: http://www.boqnews.com/coluna.php?cod=2145

Só ocupo esse espaço semanalmente porque existo. E se existo, devo a algumas pessoas,
entre elas minha avó Calixta, espanhola da gema. Foi por intermédio de suas mãos que cheguei ao mundo, em um quarto arejado de um sobrado na Rua João Guerra, 330, em Santos.

Agradeço até hoje sua perícia de parteira. Habilidade, aliás, elogiada pelo médico que visitou mamãe, posteriormente:“Dona Calixta se saiu melhor do que muito obstetra”,ouvi de minha própria mãe anos mais tarde.

Também o juiz do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, surgiu no STF pelas mãos
de alguém. Claro, não foi de dona Calixta, mas sim de uma indicação do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso.

Pois foi exatamente o doutor Gilmar quem, como relator, praticamente definiu que, a partir de agora, o diploma de Jornalismo deixa de existir como pré-requisito para aqueles que pretendem exercer a profissão.

Em um arroubo de argumentação, equiparou o Jornalismo à arte da Culinária. Bem, entendo que há pessoas extremamente competentes em todos os segmentos e, é lógico,
também na cozinha. Mas considero que todas essas pessoas, se tiverem a oportunidade de frequentar um bom curso na área, terão condição de se tornar melhores profissionais ainda.

Claro, pode até haver autodidatas, e há. Alguns que até demonstrem desempenho melhor
do que formados recém saídos dos bancos universitários. Mas é óbvio - só mesmo
quem esbarra na miopia não entende - que, por mais talento tenha o sujeito, um bom curso no qual se discutam os dilemas éticos e mesmo técnicos das profissões será de fundamental relevância para melhores profissionais no mundo.

Fico aqui imaginando minha avó parteira se tivesse a oportunidade de frequentar uma escola de Medicina. Provavelmente teria alcançado fama na área médica. Da mesma forma, pessoas que desde a infância apresentam sensos crítico e ético apurados, amplo repertório cultural e facilidade de expressão parecem me ter futuro assegurado no Jornalismo. Mas aí tenho que ouvir, ver e ler baboseiras de que Medicina e Jornalismo são diferentes. Um profissional da área branca mata, o das letras não. Ignorância.

A Grande Reportagem interpretativa tem historicamente suas raízes no crack da Bolsa
dos EUA, em 1929. A crítica na época foi a de que o Jornalismo precisaria mudar para dar mais contexto para seus leitores. Explicar aos investidores que a Bolsa sobe, mas também cai. Ocorre que o Jornalismo de então não cumpriu seu dever. Resultado: desespero dos aplicadores. Consequência imediata: diversos suicídios nos EUA.

A verdade é que, tanto quanto qualquer profissão, o Jornalismo mal feito traz consequências desastrosas. Por isso, precisa, cada vez mais, de base científica para ser praticado.

Minha avó Calixta, se estivesse viva, tenho certeza, pensaria assim. Pena que o ministro do STF Gilmar Mendes não pense. Tanto que em uma simples canetada, com o apoio de outros juízes, jogou todos os jornalistas brasileiros dentro de uma cozinha. Acendeu o fogo e, debaixo de sua toga, parece torcer para que uma das profissões mais importantes do Planeta vire pó.

Aliás, está na Bíblia: do pó vieste e ao pó retornarás. Até lá doutor Gilmar!!!

Em tempo, prometo falar de futebol na semana que vem.

Obs: reproduzido do jornal Boqueirão News – A mudança no título do artigo foi feita pelo autor do blog visando especificar o tema.